As autoridades angolanas terão recorrido ao plasmado na Lei sobre o Regime Jurídico dos Cidadãos Estrangeiros na República de Angola, particularmente sobre cidadãos que constituem ameaça à ordem interna, para impedir que o político moçambicano Venâncio Mondlane entrasse, nesta quinta-feira, 13, em Angola para participar numa conferência internacional da IDC, no quadro dos 59 anos da UNITA, cogitou o jurista e presidente da ONG Pro Bono Angola.
Ao reagir ao episódio, Bartolomeu Milton recordou o disposto no artigo 22.º, com a epígrafe ‘Interdição de Entrada’, que refere que “Ao cidadão estrangeiro inscrito (...) é interdita a entrada em território nacional em virtude de: a)- Ter sido objecto de uma decisão de expulsão do País há menos de 5 anos; b)- Ter sido condenado em pena acessória de expulsão com trânsito em julgado; c)- Apresentar forte indício de constituir uma ameaça para a ordem interna ou para a segurança nacional.
Destes fundamentos legais, o líder da organização não-governamental de carácter filantrópico e base voluntária observou que “apresentar forte indício de constituir uma ameaça para a ordem interna ou para a segurança nacional” é o cenário mais provável de estar associado à decisão das autoridades migratórias angolanas de impedir a entrada de Mondlane no País.
“Parece ser, digamos, a justificação que possa, eventualmente, existir para que Venâncio Mondlane e outros estejam a ser impedidos de entrar no País: apresentar forte indício de constituir – não é que ele seja já – uma ameaça para a ordem interna ou para a segurança nacional”, observa o jurista.
Realça o perfil revolucionário do segundo candidato mais votado das eleições gerais de Outubro de 2024 em Moçambique e o facto de ser um político que “movimenta paixões, que inflama paixões”.
“Actualmente, não se pode dizer que [Daniel] Chapo [Presidente de Moçambique] está em paz. Chapo está a ter uma governação muito difícil”, recorda o presidente da ONG Pro Bono Angola..
Mondlane diz estar bem
Venâncio Mondlane foi, nesta semana, ouvido pela Procuradoria-Geral da República de Moçambique, no quadro das manifestações espoletadas após o anúncio dos resultados eleitorais que deram vitória ao partido Frelimo, no poder desde a independência do país, em 1975.
“Foi-me aplicada uma medida [de coação] sancionatória e de limitação. Isto significa que eu não me posso deslocar sem avisar a Procuradoria, não posso ficar por mais de cinco dias fora da minha casa”, disse, após sair da audição de cerca de 10 horas, acrescentando que lhe foi garantido que poderá continuar a exercer as suas actividades políticas normalmente.
Após ter sido forçado pelas autoridades migratórias angolanas a regressar à África do Sul, Mondlane – que, por ser cidadão moçambicano, goza de isenção de visto de entrada em Angola, e garante ter sido autorizado a sair do seu país – recorreu à sua página oficial do Facebook para tranquilizar os seus seguidores, e prometeu dar mais explicações numa live nesta sexta-feira.
Numa outra mensagem, fazendo ainda referência aos episódios passados no Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro, em Luanda, denunciou que “confirmado que VM7 já estava fora de Angola, mandaram um avião presidencial, carros de luxo protocolares, para os antigos Chefes de Estado que foram retidos por mais de 8 horas” no aeroporto de Luanda.
Convidados à conferência desistem do evento
Contactado pela E&M, o deputado do Grupo Parlamentar da UNITA, Olívio Kilumbo, que acompanhou todo o desenrolar do processo a partir do ‘4 de Fevereiro’, não confirma as informações avançadas por Mondlane sobre alegado envio de “avião presidencial, carros de luxo protocolares” para apoiar os convidados à conferência desta quinta-feira, 14, em Benguela, do maior partido na oposição em Angola.
Esclarece que, contrariamente ao ex-Presidente da Colômbia, Andrés Pastrana Arango, que chegou na manhã de quarta-feira, 13, a Luanda, e entrou sem grandes constrangimentos, apesar de não lhe ter sido dirigido um “tratamento protocolar adequado”, o antigo Chefe de Estado do Botswana, Ian Seretse Khama, “teve de suportar 10 horas” para ser autorizado a entrar em Angola.
“O ex-Presidente Pastrana ainda reconsiderou seguir para Benguela, mas não conseguimos voo para chegar a tempo do evento; mas o antigo Presidente Seretse Khama afirmou logo que já não participaria na conferência, protestando contra o tratamento dado por Luanda”, explica o deputado.
Até ao momento, o Estado angolano não emitiu quaisquer esclarecimentos públicos sobre a sua posição em relação ao polémico assunto, apesar das várias tentativas de a imprensa – incluindo a revista E&M – fazer o devido contraditório.