A proposta de revisão do OGE 2020 terá como estimativa o preço do barril de petróleo abaixo dos 35 dólares, ao contrário dos 55 dólares previstos na versão inicial, numa altura em que os principais produtores mundiais cortam na produção, na tentativa de equilibrar os preços, em queda ascendente desde o surto da Covid-19.
Angola estabeleceu o próximo mês de Junho como a data provável para a conclusão da revisão do Orçamento Geral do Estado (OGE) 2020, conforme determina o Decreto Presidencial 96/20 de 9 de Abril, recentemente aprovado pelo Conselho de Ministros, em resposta aos impactos da baixa do preço do petróleo nos mercados internacionais.
A decisão, segundo o Governo, está a ser tomada em alinhamento com o momento que o mundo está a viver e numa altura em que Angola está a ser atingida por uma onda de vários choques, entre os quais o surto do novo coronavírus Covid-19, que continua a fazer centenas de vítimas mortais em todo mundo.
Em recentes declarações aos jornalistas, a ministra das Finanças, Vera Daves, afirmou que o processo de revisão do OGE 2020 terá como estimativa o preço do barril de petróleo abaixo dos 35 dólares, tendo assegurado que a respectiva proposta deverá ser submetida à Assembleia Nacional até ao dia 15 de Maio do corrente ano, para eventual aprovação.
Nos seus argumentos de defesa para a revisão do OGE 2020, a titular da pasta das Finanças referiu que a medida, além de ter como base a baixa do preço do petróleo, deveu-se igualmente aos impactos negativos que a Covid-19 está a ter sobre a economia, impondo fortes restrições na mobilidade, no comércio internacional e na produção de vários bens que se reflectem na redução dos fluxos comerciais.
Na parte fiscal, prosseguiu a ministra, será necessário rever as projecções, como forma de se manter o equilíbrio estratégico das contas públicas, sem descurar o apoio financeiro que deve ser dado ao sistema nacional de saúde e a todas as medidas de combate à propagação da Covid-19.
Enquanto decorre a preparação da proposta de revisão do OGE 2020, Vera Daves está autorizada, por decreto presidencial, a implementar medidas de políticas adicionais, nomeadamente a utilização de activos do Fundo Soberano de Angola (FSDEA) para a obtenção de recursos financeiros adicionais para o Tesouro Nacional, no valor de 1,5 mil milhões de dólares, “mediante o compromisso de uma recapitalização futura tão logo as condições das finanças públicas o permitam”.
Ao abrigo do mesmo diploma, a ministra está também autorizada a acelerar “o processo de alienação de participações e activos do Estado, no âmbito do Programa de Privatizações”, podendo ainda, no quadro da mesma orientação, autorizar o Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) a investir em Títulos do Tesouro, no mercado primário, “garantindo a rentabilidade e a adequada remuneração dos capitais”.
Por outro lado, está também autorizada a suspender “a componente de pagamento em cash, no âmbito do Programa de Regularização de Atrasados do Estado com origem fora do Sistema Integrado de Gestão Financeira do Estado”.
Dentro do mesmo quadro, a governante deverá ainda desenvolver acções com o Banco Nacional de Angola (BNA) e os bancos do sistema financeiro nacional, no sentido de alcançar uma taxa mínima de 50% para a rolagem da dívida pública interna, bem como identificar e operacionalizar todas as fontes de financiamento possíveis para a mobilização de recursos para fazer face aos efeitos directos e indirectos da pandemia da Covid-19.
Aprovado pelo Parlamento em Dezembro do ano passado, o OGE 2020 prevê despesas e receitas no valor de 15.875.610.485.070,00 de kwanzas, mais 4,5 biliões em relação ao de 2019.
O Governo elaborou o OGE 2020 tendo como pressupostos um preço médio do barril de petróleo bruto de 55 dólares, uma taxa de inflação de 24% e um crescimento real do Produto Interno Bruto (PIB) de 1,8%.
O preço médio do barril de petróleo está, há vários meses, entre os 20 e os 30 dólares, o que, segundo o Governo, obriga o país a ter de fazer um reajuste em baixa das despesas e receitas projectadas para o OGE 2020.
No actual cenário, há quem perspective que a economia nacional venha a sofrer uma recessão superior a 2%, em 2020, como relata na sua mais recente análise sobre a economia nacional a consultora inglesa Oxford Economics.
"Vamos rever drasticamente em baixa a previsão de crescimento económico e as métricas da dívida, já que esperamos que o crescimento económico (de Angola) registe uma contracção de mais de 2% em 2020 e que o saldo orçamental e corrente registe défices, ao invés dos excedentes que prevíamos", lê-se na análise.
No documento, a consultora sugere que Angola está a enfrentar uma espécie de tempestade, devido, nomeadamente, à quebra do preço do petróleo nos mercados internacionais, à redução drástica do comércio internacional e da procura de petróleo, situação agravada com o surto do novo coronavírus que obrigou o Governo a ter de fechar as suas fronteiras, limitando a circulação de pessoas e bens.
"Enquanto estiver vigente, o fecho de fronteiras vai ter um efeito adverso significativo, embora talvez temporário no comércio e na actividade económica, e vai empurrar os preços para cima devido à escassez", apontam os analistas, antevendo que o país, face à situação que vive, deverá necessitar de mais financiamento do Fundo Monetário Internacional (FMI), emissões de dívida soberana e ajuda externa para financiar as contas públicas, durante a crise provocada pela expansão do novo coronavírus.
"Infelizmente, as autoridades encontram-se numa situação com pouca margem para estimular a economia, seja através da política orçamental, seja através da política monetária", escreveram os analistas, lembrando que recentemente a Standard & Poor's (S&P) baixou o rating do país, de B- para CCC+, por causa da queda abrupta dos preços do petróleo e do agravamento dos défices externo e orçamental, factores que a Oxford Economics acredita que poderão levá-la também a baixar o rating de Angola nos próximos meses.
No texto, os analistas lembram que "a guerra de preços no petróleo é um golpe devastador para a economia angolana, já que os hidrocarbonetos valem 96% das exportações, cerca de 33% do PIB e 60% da receita governamental", concluindo que o apoio contemplado no programa de assistência do Fundo Monetário Internacional não vai ser suficiente para "salvar a economia das consequências da guerra de preços".