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Retrospectiva: Angola regista mais de mil novos casos de cancro da próstata anualmente

Sebastião Garricha
26/12/2024
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Foto:
DR

O País experimentou, a 5 de Agosto de 2024, a primeira cirurgia robótica para casos de cancro da próstata, feita a um paciente de 60 anos, que recebeu alta dias após o procedimento médico.

O cancro da próstata, que tem a particularidade de evoluir silenciosamente, continua entre as três doenças cancerígenas mais diagnosticadas no País.

De 2020 a 2022, o País registou um total de 646 mortes por complicações com cancro da próstata, segundo dados do Instituto Angolano de Controlo de Câncer (IACC) - estabelecimento público de saúde da rede hospitalar de referência nacional integrado no Serviço Nacional de Saúde para prestação e assistência no domínio da prevenção e diagnóstico precoce do cancro, bem como do tratamento especializado e completo dos pacientes portadores da patologia.

De acordo com a ministra da saúde, Sílvia Lutucuta, o País regista, anualmente, mais de mil casos novos de cancro da próstata, a maioria em estado avançado e com sintomas graves. 

Dados de um relatório do MINSA, citado pelo Jornal de Angola a 4 de Agosto último, indicam que, do total de 3.590 homens já atendidos durante a primeira semana da campanha de rastreio do cancro da próstata, em quatro províncias do País, 477 testaram positivo ao exame de Antígeno Prostático Específico (PSA).

De acordo com o documento, os casos foram diagnosticados nos hospitais gerais de Cacuaco "Heróis de Kifangondo” e de Viana "Bispo Emílio de Carvalho”, ambos na província de Luanda, "Reverendo Guilherme Pereira Inglês”, no Bengo, "Ervanário Luís Gomes Sambo”, em Cabinda, e no Hospital Central da Huíla "Dr. António Agostinho Neto”.

Entre os hospitais citados, o "Heróis de Kifangondo” é o que rastreia o maior número de pacientes, tendo sempre uma média diária de 300 homens atendidos.

Angola experimentou primeira cirurgia robótica 

Conduzida por uma equipa coordenada pelo especialista Vipul Patel, que chegou acompanhado de mais cirurgiões norte-americanos, a histórica cirurgia foi realizada no Hospital Cardeal Dom Alexandre do Nascimento.

De acordo com o médico-cirurgião, por se tratar da primeira cirurgia robótica a acontecer na África Ocidental, Angola torna-se um País inovador no que diz respeito aos cuidados de saúde.

No quadro da parceria entre o Governo angolano e a norte-americana Global Robotics Institute, médicos nacionais vão dispor da oportunidade para aperfeiçoar conhecimentos sobre cirurgia robótica nos EUA.

Vipul Patel desenvolveu, nos EUA, técnicas em cirurgia robótica, que se traduziram em atendimento e resultados significativamente melhores para os pacientes.

As inovações introduzidas pelo médico norte-americano ajudaram a melhorar o tratamento do cancro da próstata e o retorno precoce da continência urinária e da função sexual. 

O urologista oncológico já realizou mais de 18 mil cirurgias robóticas durante a carreira, sendo um formador que introduziu a cirurgia robótica, além dos EUA, no Brasil e na América Latina.

“Situação do cancro em África é desanimador” - OMS

A situação do cancro no continente africano é desanimadora, de acordo com a Directora Regional da Organização Mundial da Saúde para a África, Matshidiso Moeti. 

Discursando por ocasião do Dia Mundial Contra o Cancro, como consta do site da OMS, Matshidiso Moeti revela que em 2022 ocorreram 882.882 novos casos de cancro na Região, com 573.653 óbitos. 

Segundo a responsável, cerca de 50% dos novos casos da patologia em adultos na região devem-se a cancros da mama, do colo do útero, da próstata, colorrectal e do fígado.  

“Se não forem tomadas medidas urgentes, prevê-se que a mortalidade por cancro na Região atinja cerca de um milhão de mortes por ano até 2030. Além disso, em 20 anos, as taxas de mortalidade por cancro em África ultrapassarão a média mundial de 30%”, alerta Matshidiso Moeti. 

A responsável explica que isso se deve, sobretudo, ao facto de as taxas de sobrevivência ao cancro na Região Africana da OMS serem actualmente de 12%, muito inferiores à média de mais de 80% nos países de elevado rendimento. 

“Não obstante, não podemos deixar de louvar os progressos realizados na prevenção e nos cuidados do cancro na nossa Região. Por exemplo, 17 países introduziram testes de rastreio baseados em testes de rastreio de alto desempenho conforme as recomendações da OMS”, sublinha a responsável.

Para finalizar, Matshidiso Moeti refere que 28 dos Estados-Membros da OMS introduziram a vacinação contra o vírus do papiloma humano (HPV) ao nível nacional para alcançar cerca de 60% da população prioritária visada com a vacinação contra o HPV.

Uma patologia que não escolhe cor, status social nem nacionalidade

O Cancro da Próstata, também denominado carcinoma da próstata, é uma doença que se desenvolve na próstata – uma glândula do sistema reprodutor masculino –, que não escolhe cor, nacionalidade ou estatuto social: basta que se seja homem com idade igual ou superior a 45 anos para se estar entre os alvos da doença que anualmente ceifa vidas e deixa várias centenas de agregados sem a figura paterna.

Apesar de não existirem causas específicas para o seu desenvolvimento, Adão Ambrósio e Heriberto Backman, dois urologistas consultados pela Economia & Mercado (E&M), apontam alguns factores que podem estar estreitamente associados a um maior risco de se ter a patologia.

Por exemplo, as pessoas com parentes de primeiro grau (avô, pai ou irmão) que tenham histórico da patologia devem procurar o médico relativamente mais cedo. As pessoas com dietas alimentares pouco equilibradas e muito ricas em gorduras ou cálcio também são muito propensas à patologia, bem como obesos ou pessoas com excesso de peso.

Segundo dados de um estudo feito nos Estados Unidos da América, os afrodescendentes têm duas vezes mais chances de diagnóstico do cancro da próstata que os homens de ascendência europeia.

Publicado em 2020, na revista médica Jama Network, o documento diz que os homens negros têm mais sensibilidade androgénica, ou seja, o organismo mais sensível à acção da testosterona que favorece o surgimento do cancro da próstata.

Além disso, dados de uma notícia publicada em 2022, pelo portal de Drauzio, indicam que pelo menos 60% dos casos de cancro de próstata ocorrem em homens negros.

Sinais da doença

Segundo Adão Ambrósio, o cancro da próstata manifesta-se através de sinais e sintomas próprios como, por exemplo, sangramento na urina, dor na região do escroto entre o ânus e os testículos e jacto urinário fraco. 

Nesta altura, segundo explicações do especialista, regista-se aumento ou alguma alteração na próstata, que vai cresce e comprime a uretra, originando a diminuição da pressão no jacto urinário e aumento da necessidade de todas as noites levantar para urinar (frequentemente), dando sempre a sensação de bexiga cheia.

“É obrigatório procurar um médico quando se registam todos esses sinais aos 50 anos, mesmo se tiver menos de 40”, recomenda o urologista, explicando que existem infecções de transmissão sexual que podem aparecer abaixo dos 50 anos, comummente vistas apenas em pessoas diagnosticadas com cancro da próstata.

Fala, por exemplo, da prostatite – uma infecção que se manifesta, também, através da inflamação da próstata –, que pode acometer homens através de infecções de transmissão sexual maltratada e provocar cancro da próstata.

Geralmente, uma pessoa com cancro da próstata tende a perder massa muscular e emagrecer bastante devido ao quadro de dor, que o vai gastando, podendo levá-lo à morte, segundo explicações do especialista.

Diagnóstico precoce aumenta chances de cura

O diagnóstico do cancro da próstata é feito a partir dos exames laboratoriais, como a biópsia da próstata e o conhecido exame do toque rectal – que ainda enfrenta bastante receio e preconceito por parte do público-alvo. 

De acordo com a OMS, realizar o exame Antígeno Prostático Específico, popularmente chamado de PSA, é o passo para o acesso a uma melhor qualidade de vida com a medicação já disponível.

“Com um diagnóstico precoce, a chance de sobreviver é de muitos anos. O cancro da próstata é diferente, tem mais terapêuticas que funcionam”, explica a OMS, revelando que o exame pode retardar a morte de até 30% dos pacientes confirmados.

Entretanto, a questão é que grande parte dos homens vai ao médico com uma fase já avançada da doença, num estágio em que se ‘contam aos dedos’ as chances de cura, como explica Heriberto Backman.

Para o especialista em urologia, diferentemente das mulheres – que muitas vezes procuram o médico para consultas de rotina –, a maioria  dos homens vai à consulta de urologia por causa de problemas ligados à disfunção sexual.

“E normalmente encontramos as diversas patologias”, revela Heriberto Backman, especialista há pelo menos três décadas.

Concordando com Heriberto Backman, Adão Ambrósio explica que, na maioria dos casos, a razão de os homens chegarem ‘tarde’ ao médico, já em fase terminal, deve-se a vários tabus em relação à doença e ao tratamento.

“Então, as pessoas preferem esconder-se. Não se abrem. Quando chegam aqui, em fase muito avançada, às vezes já vão a operar, muitos deles até acabam vindo na cadeira de rodas. Há quem tenha medo de pensar em cancro da próstata por causa do tabu. Mas o diagnóstico precoce... é a melhor solução. É operável cedo e as chances de cura são maiores”, finaliza.