O Cuito, capital da província do Bié, é frequentemente referido como o "coração de Angola". Este título não se deve apenas à sua localização geográfica, que alberga o centro geodésico do País e as nascentes do majestoso rio Kwanza, que atravessa sete províncias, mas também à sua importância histórica, social e cultural. A cidade, marcada por cicatrizes profundas da guerra civil, hoje busca recuperar-se e desenvolver-se, mantendo o equilíbrio entre crescimento urbano e preservação ecológica.
1. Clima e Bênçãos da Natureza
O clima do Cuito é um dos seus maiores trunfos naturais. A cidade beneficia de frequentes e abundantes chuvas ao longo do ano, um factor que, se bem aproveitado, pode ser transformado em riqueza. Essas chuvas, que alimentam a nascente do rio Kwanza e irrigam as férteis terras agrícolas da província, são um recurso fundamental para a produção agrícola, a principal actividade económica da região. Com uma gestão adequada das águas pluviais, o Cuito pode não só garantir o abastecimento de água potável para as populações mais vulneráveis, mas também usar esse recurso precioso para outras finalidades urbanísticas, como a irrigação de espaços verdes e a limpeza das vias públicas.
No entanto, essas chuvas também trazem desafios, como a erosão e a formação de ravinas, que ameaçam algumas zonas da cidade. Estas ravinas, muitas vezes negligenciadas pelas autoridades, chegam a cortar a circulação, dividir bairros e desalojar famílias inteiras. A solução para este problema, no entanto, pode ser encontrada na própria natureza: a arborização. Plantar árvores em áreas estratégicas não só ajudaria a prevenir a erosão e a estabilizar o solo, mas também traria inúmeros benefícios ambientais, como a redução das temperaturas e a purificação do ar.
2. Crescimento Demográfico e Económico
Com uma população que ronda os 600 mil habitantes, o Cuito é uma cidade em expansão. O seu crescimento demográfico é impulsionado por factores económicos, sobretudo o comércio informal, que faz do Cuito uma placa giratória para o escoamento de produtos agrícolas de municípios como Chinguar, Camacupa, Catabola e Andulo. A fertilidade da terra no Bié faz com que esta região seja um celeiro para Angola, produzindo alimentos em grande escala que abastecem tanto a cidade como outras províncias do País.
Este crescimento económico, no entanto, trouxe consigo novos desafios, como a crescente procura por habitação. Nos últimos anos, o aumento da população e a melhoria das condições de vida resultaram na valorização dos imóveis, o que tem encarecido as rendas. Alguns exemplos notáveis de desenvolvimento habitacional são os projecto de 500 casas, centralidade Horizonte e o conhecido condomínio das FAA, construído na periferia da cidade. Estes empreendimentos oferecem habitações modernas e dignas a muitas famílias, contribuindo para melhorar as condições de vida e reduzir a pressão sobre os bairros mais informais.
Além disso, as instituições de ensino superior e o Hospital Dr. Walter Strangway desempenham um papel importante ao atrair profissionais de outros pontos do país e até do estrangeiro. Este fluxo de pessoas em busca de oportunidades de trabalho e formação tem contribuído para o encarecimento das rendas e o aumento da procura habitacional. O Cuito, desta forma, não cresce apenas pela lógica do êxodo rural, mas também pela mobilidade interna, intercidades, com pessoas de outras cidades de Angola a estabelecerem-se na capital do Bié em busca de melhores empregos e qualidade de vida.
3. Infraestruturas Educacionais, de Saúde e Comunicação
Do ponto de vista social, o Cuito tem feito avanços notáveis. Hoje, a cidade conta com cinco instituições de ensino superior, incluindo uma universidade, duas públicas e três privadas. A par disso, foram criados diversos institutos médios, públicos e privados, que servem como centros de formação para a juventude local. Na área da saúde, o Hospital Regional Dr. Walter Strangway, o hospital municipal do Cunje, o hospital pediátrico e o centro materno-infantil têm desempenhado um papel crucial, proporcionando cuidados médicos à população, sendo o primeiro uma infra-estrutura de referência para toda a região centro-sul de Angola.
No sector da comunicação, o Cuito possui uma Mediateca de qualidade, à altura das necessidades da sua população, proporcionando acesso à informação e à educação para milhares de habitantes. Além disso, a cidade é servida por três rádios, uma pública e duas privadas, que oferecem uma diversidade de conteúdos para os ouvintes. Possui também representações da Televisão Pública de Angola, Racional Nacional de Angola, Jornal de Angola e Angop. Pojectos de comunicação digital também têm surgido nas plataformas de internet, dando voz e vez aos munícipes, ao mesmo tempo que divulgam a imagem do Cuito para o resto do País e além-fronteiras.
4. Desafios Urbanísticos e Ecológicos
O crescimento do Cuito, contudo, não tem sido homogéneo. Observa-se uma tendência da cidade a expandir-se mais rapidamente no sentido sul, em direcção ao Cuito-Huambo, enquanto a expansão no sentido Cuito-Andulo tem sido menos pronunciada. Esta expansão assimétrica pode ser explicada por razões económicas e infra-estruturais, com melhores acessos e oportunidades concentradas no corredor sul. No entanto, é necessário equilibrar este crescimento para evitar a criação de áreas periféricas negligenciadas.
É neste ponto que surgem as grandes preocupações urbanísticas e ecológicas para o futuro do Cuito. Como muitas outras cidades angolanas, a periferia do Cuito está a crescer de maneira desordenada. A proliferação de bairros informais, construídos sob o olhar complacente das autoridades, já começa a replicar os problemas crónicos de cidades como Luanda, onde a ausência de um planeamento adequado resultou em inundações frequentes, trânsito caótico e dificuldades no fornecimento de serviços essenciais, como electricidade, saneamento e água potável.
Um plano director urbano é essencial para orientar este crescimento de forma sustentável. Este documento deve envolver a participação de arquitectos, urbanistas, ecologistas, sociólogos e, principalmente, os próprios habitantes. É necessário evitar a segregação espacial, que tende a empurrar os mais pobres para zonas de risco, onde estão mais expostos a problemas ambientais e sociais.
As ravinas que afectam algumas zonas do Cuito podem ser mitigadas com a criação de infra-estruturas de contenção e, principalmente, através da arborização das áreas vulneráveis. O plantio de árvores em torno das áreas de risco não apenas estabilizaria o solo, mas também criaria uma barreira natural contra a erosão, evitando o alastramento dessas ravinas que ameaçam a segurança das populações.
5. A Importância do Planeamento Ecológico e Sustentável
A arborização, elemento muitas vezes negligenciado, pode desempenhar um papel fundamental na melhoria da qualidade de vida urbana. Um plano de arborização que tenha em conta as particularidades ecológicas de cada bairro pode ajudar a mitigar problemas como a erosão do solo, a poluição do ar e o excesso de calor. Árvores como o eucalipto, o salgueiro ou o freixo, que são conhecidas pela sua capacidade de absorção de água, poderiam ser plantadas em zonas estratégicas para ajudar a controlar as águas pluviais.
Além dos benefícios ecológicos, as árvores também têm um impacto social e económico. Proporcionam sombra, embelezam as ruas, tornam os bairros mais agradáveis e podem mesmo atrair turistas, criando novas oportunidades para o comércio local. Cidades como Kigali, no Ruanda, e Curitiba, no Brasil, servem como exemplos de sucesso em planeamento urbano sustentável, combinando crescimento económico com preservação ambiental.
6. A Responsabilidade Colectiva e o Valor das Ideias
É importante lembrar que nem tudo se resolve com dinheiro. Ideias inovadoras, que envolvem a participação activa dos cidadãos e das autoridades, são o principal motor de transformação. Essas ideias têm o poder de atrair recursos e mobilizar sensibilidades e financiamentos. O Cuito tem o potencial de se transformar numa cidade modelo, mas para isso é preciso investir em soluções criativas e sustentáveis. As ideias, quando bem executadas, mobilizam as pessoas, atraem investidores e financiam projectos que, por si só, transformam uma cidade.
Em conclusão, o Cuito ainda tem tempo de se transformar numa cidade modelo, funcional e sustentável. Mas, para tal, é necessário que as autoridades locais adoptem uma postura proactiva e planeiem o futuro com responsabilidade. O desenvolvimento urbano deve ser harmonioso, integrando infra-estruturas adequadas, serviços essenciais e uma preocupação constante com a sustentabilidade ambiental.
Afinal, é o homem que transforma a natureza, e cabe aos habitantes do Cuito mobilizar as suas energias e inteligências para construir uma cidade que orgulhe não só os bienos, mas todos os angolanos. O futuro do Cuito está nas mãos daqueles que nele habitam, e o sucesso da cidade depende do contributo de todos para um crescimento equilibrado e sustentável.