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Os anos negros da banca

Domingos Amaro
4/8/2022
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Foto:
DR

Os anos de 2019 e 2020 foram os mais difíceis na história do sector bancário e no mandato do actual Governo, em que registaram resultados negativos.

Não obstante o parecer positivo de Marcos Souto sobre a estabilidade da banca e dos resultados positivos agregados dos últimos cinco anos, a verdade é que 2019 e 2020 foram os anos mais difíceis na história do sector bancário e no mandato do actual Governo, em que registaram resultados negativos.

Com a mudança do regime cambial, que teve início no primeiro trimestre de 2018 e posteriormente a liberalização da taxa de câmbio no último trimestre de 2019, vários bancos observaram uma diminuição dos proveitos de operações cambiais, que originaram uma redução do produto bancário em mais de 20%. Associado a este facto, e com os resultados da segunda Avaliação da Qualidade dos Activos (AQA), houve a necessidade de alguns bancos efectuarem o reforço das imparidades constituídas para o crédito, acarretando, em 2019, ao sector bancário um prejuízo de 117,49 mil milhões de kwanzas.

Em 2020, o prejuízo foi superior na ordem de 498,02 mil milhões de kwanzas, devido à sequência das regras anteriores, efeitos negativos da Covid-19 e pela descida da notação de rating de Angola pela Moody’s, de B3 para Caa1, bem como pela agência de notação financeira Fitch, que baixou o rating de B para CCC, que teve um impacto significativo no apuramento de perdas por imparidades adicionais nas posições detidas pelos bancos, que é a dívida pública angolana e crédito ao Estado. Contas feitas, o sector bancário perdeu 615,69 mil milhões de kwanzas nos últimos cinco anos, muito por culpa do aumento das perdas com negociações de crédito, observados, principalmente, em dois bancos sistémicos: Banco de Poupança e Crédito (BPC) e o Banco Económico (BE).

Por falar destes dois bancos, tanto o BPC, tanto o BE, continuam a ser o “cancro” do sistema financeiro angolano. Os dois encontram-se, nesse momento, em processos de reestruturação e recuperação, face ao alto nível de malparado e degradação dos activos e capitais próprios mínimos regulamentares. O maior banco de capital público está em reestruturação desde 2018, ano em que começou a receber as injecções de capital para assegurar a sua solidez e robustez. Mas, até agora, não surtiu efeito algum. É o banco com o maior prejuízo de sempre na história da banca nacional, tendo registado, em 2020, resultado líquido negativo de 535,9 mil milhões de kwanzas, superando o prejuízo de 404,7 mil milhões registado em 2019. Neste ano (2019), o BPC teve um crédito malparado no valor de 1,24biliões de kwanzas, representando 70% do total da banca. E como forma de resgate, o Estado decidiu atribuir a missão à gestora de activos, Recredit,para recuperar todos os activos em incumprimento até 2029.

Mas, desde 2020 até Dezembro do ano transacto, a Recredit só recuperou 21,8 mil milhões de kwanzas, ou seja, 1,8% dos activos tóxicos do BPC, cujo valor da carteira de crédito malparado serviria para financiar os sectores da Saúde e da Educação, durante três anos. Segundo o relatório da instituição, a que a E&M teve acesso, do total resgatado pela Recredit, 71,5% foi pago com activos imobiliários e apenas 6,2 mil milhões de kwanzas é dinheiro “fresco”. A maior parte dos devedores do BPC encontram-se no sector da construção e do comércio, que juntos representam 68,3% de todos os 476 processos,quer em negociação, quer em contencioso.

O Ex-BESA é o segundo pior banco no mercado, sendo que tem uma dívida acumulada de 256,96 mil milhões de kwanzas junto do BNA, contraída em 2016, e que continua em incumprimento nos balanços do regulador bancário, já que o banco está há vários anos com problemas de liquidez e sem uma solução à vista sobre a futura estrutura accionista. O BNA abriu a porta à entrada de investidores estrangeiros no Banco Económico, mas como as contas do banco não são tornadas públicas há mais de três anos, os investidores demonstram algum receio em comprar um bem sem conhecer detalhadamente o que está à venda.Esgotada esta possibilidade, o mais recente caminho encontrado, em Dezembro último, foi a transformação dos cinco maiores depositantes em novos accionistas. Com esta engenharia, o BNA espera que o Banco Económico possa cumprir com todos os requisitos regulamentares vigentes, incluindo o reequilíbrio patrimonial e o desagravamento dos níveis de liquidez e de solvabilidade.

Apesar deste esforço, em diversos meios persistem as reservas em relação ao futuro deste banco. “É um dos maiores problemas da banca angolana porque existe o risco de se adquirir algo com elevadíssimos riscos, que está a ser alvo de uma reestruturação, cujo fim pode não corresponder às expectativas de um potencial comprador”, comentou em anonimato uma fonte da Deloitte Angola.

Os economistas ouvidos pela Economia & Mercado defendem que o BPC e BE, apesar de serem sistémicos, já deveriam ser excluídos há algum tempo do sistema bancário nacional, porque não estão em condições técnicas, levando o sector à má performance, com um efeito de “bola de neve” que vai arrastando os outros bancos. Porém, reconhecem igualmente que tal facto “só não acontece por se tratarem de bancos públicos que servem o interesse de quem governa”.