Na data formal em que se celebra o continente Africano, as agendas das discussões sobre a realidade actual do mesmo é recheada de temas em torno dos desafios e das abordagens destes, haja vista o ideal da “África que queremos”. A Educação como campo de estudo, e também como objecto de estudo, tem sido central, dados os seus atributos na produção da cultura e, também, como catalisadora dos sujeitos nas pessoas. Entre os debates a sinalizar, sublinhamos o relativo às abordagens da África como matéria da pauta na Educação escolar formal, abordagem circunscrita ao contexto sócio-espacial de Angola.
Como a maior parte dos espaços geo-políticos do continente, Angola experimentou a ocupação colonial que resultou no legado de uma estrutura de relações de poderes simbólicos e políticos fundados nas ideologias imperialistas do colonialismo. Nesta experiência colonial, a Educação teve a função política de instrumento de um suposto acto civilizatório que, na essência, consistia em anular a mundividência dos povos de Angola, sendo-lhes imposta as geradas pelos mitos dos saberes superiores europeus na relação com os demais povos. A Educação como acto de apropriação da cultura é transformada num processo de alienação das pessoas e da anulação da sua condição de sujeitos nos processos da recriação e criação da cultura como legado ancestral. É esta realidade política que gera a biblioteca colonial, como a universalização dos saberes ocidentes, independentemente da sua nobreza na relação com as culturas alheias.
Nesta experiência colonial, a Educação teve a função política de instrumento de um suposto acto civilizatório que, na essência, consistia em anular a mundividência dos povos de Angola
A superação do projecto político do dito “acto civilizatório”, associada a outras pautas, sustentou os processos dos movimentos panafricanista de libertação dos povos e a independência dos espaços sócio-políticos. A luta pelas independências foi eminentemente cultural. E o desafio da educação escolar formal no pós-independência foi o da superação desta biblioteca colonial como produtor das ideologias e imaginários das relações sócio-espaciais nossas. Acontece que a realidade angolana tem revelado que esses processos sucumbiram à ditadura da colonialidade, como processo da reprodução induzida da biblioteca colonial nos processos da cultura.
A escola angolana no seu desígnio de nacionalização dos processos da educação não se apercebeu da necessidade de se fundar uma educação cujo ponto de partida deveria ser o questionamento dos saberes deste legado histórico. Ao contrário, o processo de educação gerou a ilusão que os rótulos atribuídos às disciplinas de estudo eram bastantes para a superação dos sistemas conceituais e políticos da abordagem da cultura. É o que acontece, por exemplo, no estudo da história de Angola sustentado por legado documental teórico e metodológico fundados na biblioteca colonial. Este exercício é o triunfo da colonialidade nos processos da educação.
Ao contrário, o processo de educação gerou a ilusão que os rótulos atribuídos às disciplinas de estudo eram bastantes para a superação dos sistemas conceituais e políticos da abordagem da cultura
O desafio da vez e constante para Angola, na agenda da “Africa que queremos”, é o do reconhecimento desta realidade gerada nas dinâmicas da história da produção do conhecimento fomentado pela pauta do ocidente colonial. É o necessário reconhecimento de que os sistemas de saberes actuais não são bastantes para a interpretação das realidades e dos desafios historicamente construídos nas mesmas. É, também, o necessário reconhecimento que a reforma da Educação requer, entre outros desafios, o da ressignificação das bibliotecas e das relações de poderes na produção do conhecimento. A África dos currículos da Educação em Angola é ainda aquela da biblioteca colonial.
(Isaac Paxe, Professor)