Da aprendizagem que fui retirando das leituras e estudos das matérias sobre o desenvolvimento sobrou o seguinte: há uma boa e uma má diversificação. A boa é a que se centra num modelo de competitividade de altos salários e elevada produtividade. É o modelo que funciona em contextos de economias abertas e de globalização crescente das forças produtivas nacionais. A má diversificação é alicerçada em salários baixos, produtividades incompetitivas e num mercado doméstico fechado e protector de interesses das elites económicas e políticas. A mais-valia retirada é à custa da exploração da força de trabalho, impreparada para resistir a estratégias empresariais de obtenção de lucro fácil e rápido. Nestes casos, a inserção externa das economias é feita com o apoio de subsídios à exportação, condenados pela Organização Mundial do Comércio.
A diversificação e o seu complexo processo não são matérias da exclusiva responsabilidade do Estado e das suas instituições, mas principalmente uma questão de sobrevivência das empresas, empresários e trabalhadores e da economia do país em situações de choques externos importantes (mais ou menos duradouros) e cujos efeitos se agravam quando os tecidos económicos se concentram numa única actividade de exportação e em produções locais de fraco valor de incorporação e de elevados índices de incompetitividade. A melhoria da competitividade depende, evidentemente, da existência de ambientes de negócios bem estruturados, transparentes e que convidem ao investimento privado. Esta é uma responsabilidade do Governo, do Estado e dos seus serviços de apoio ao funcionamento da economia. Mas, igualmente, dos privados, mormente pela libertação da sua mentalidade de assistidos pelas instituições públicas de quem, afinal, dependem para traçar o essencial das suas estratégias empresariais. E não deveria ser assim. Aliás e apenas a título de reflexão breve, como se pode ajudar a criar uma nova mentalidade produtivista e desenvolvimentista no sector privado nacional, quando as empresas e os empresários não são totalmente independentes do poder político?
Estudos empíricos sobre casos de sucesso de diversificação da economia em situações de posição económica relevante de recursos naturais renováveis existem desde há muito tempo. Alan Gelb e Sina Grasmann, do Departamento de Economia do Banco Mundial, estudaram uma amostra de países onde as exportações de produtos primários, portanto com fraco índice de valor agregado interno, representavam mais de 60% do total das exportações em 1971. Cinco países com uma média de exportação/PIB acima do limiar estabelecido como referência do estudo – Malásia, Tailândia, Chile, Indonésia e Sri Lanka – tiveram sucessos claros nos processos de incremento do peso relativo do sector manufactureiro no PIB e entre 1975 e 2001 a taxa média anual de aumento do PIB por habitante foi de 3,5%. No caso do Chile, a diversificação centrada na indústria transformadora apresentou a particularidade de o país ter desenvolvido a produção de muitos produtos sofisticados, graças a políticas sustentadas de inovação e investigação científica. Estes e outros autores comprovaram também que os processos de diversificação foram bem mais lentos, mais caros e menos bem-sucedidos nos países com uma proporção elevada de exportações de recursos naturais não renováveis, como o petróleo, os diamantes e outros minérios, devido aos conhecidos fenómenos de “rent-seeking” e “doença holandesa”.
A Indonésia parece ser o mais interessante exemplo de como colocar os recursos financeiros da exportação de petróleo a favor do desenvolvimento da agricultura. Mesmo tratando-se de um país com graves problemas religiosos, a aposta nacional determinada em se resistir aos efeitos do “dutch disease” e se desenvolver, em bases extensivas, a cultura e industrialização das diferentes variedades de arroz, deu certo e aparentemente está preparada para sair da fase de economia do petróleo que a caracterizou durante algum tempo. Foi graças a ter-se evitado os efeitos nefastos da “doença holandesa”, através duma política económica global e bem coordenada pelo Estado – ao contrário, por exemplo, de Angola, onde a política económica está departamentalizada e cada responsável a executa sem perscrutar os efeitos (positivos e nefastos) sobre outros domínios económicos e sociais – que permitiu aplicar uma visão estratégica de desenvolvimento, tendo-se investido os ganhos do petróleo na exploração do gás usado abundantemente na produção de fertilizantes para uso doméstico e exportação (Japão). Os adubos são distribuídos para a agricultura nacional a preços subsidiados, facilitando a obtenção de bons lucros para reinvestimento interno noutros sectores. A política cambial foi sempre usada com critério extremo, com a finalidade de se evitar o afastamento da taxa de câmbio de limites considerados incentivadores da diversificação e do crescimento económico.
A República da Coreia, a partir do momento em que a Guerra com o seu vizinho do Norte foi considerada estancada e de muito baixa intensidade (expressa por pequenos arrufos vindos da parte setentrional da Península), passou a organizar o sector da educação através de Planos a 50 anos, com objectivos bem definidos e metas perfeitamente adaptadas à sua filosofia de vida, aos recursos disponíveis e a uma vontade inabalável de se tornar parceiro dos países mais progressivos do mundo. Hoje a realidade é justamente esta: a República da Coreia está no “clube mundial dos mais ricos”.
(Continua)
Reflexão por ocasião da outorga do doutoramento Honoris Causa pela Universidade Católica de Angola, em 12 de Dezembro de 2024